30.6.07

TraVeSsiA Na Capela da USP

Meus compadres e comadres.
Dia 28 de junho eu e meu amigo e violonista Antônio de Vito realizamos a Travessia dentro da USP, mais precisamente no projeto "Capela Meio Dia e Meia."

Fizemos alí naquele espaço cultural agasalhador uma cantoria de rabeca repleta de causos, poesias caboclas e literatura de cordel.

Nossos agradecimentos ao Lelo que propiciou todas as condições para que a Travessia pudesse se dar de forma ideal; ao querido Evandro Navarro, o Véio, que com sua pesada bagagem musical também embarcou em nosso trem e soube com esmero e arte adequar a sonoridade de nossos instrumentos aos ouvidos do público-passageiro, a quem gostaríamos também de agradecer.

Desta forma então realizamos a Travessia para dentro de nossas raizes culturais e ao final da viagem temos a certeza de que saimos mais fortalecidos de que quando entramos.

Tomara que a Travesia tenha deixado sua marca gravada no coração brasileiro de cada um que alí compareceu.

Inté a próxima.

25.6.07

TRaVeSsiA

DO ROMANCEIRO À VILLA-LOBOS

Meus compadres e comadres.
Gostaria de convidar a todos para assistirem ao show Travessia nesta quinta-feira, 28 de junho, às 12:30 horas, na capela da USP.

Esta apresentação terá a participação especial do violonista Antônio De Vito que apresentará também obras solo de Antônio Lauro (Venezuela), Villa-Lobos (Brasil), Agustin Barrios (Uruguai), entre outros.

Nosso espetáculo aborda a cultura popular brasileira desde a vinda do romanceiro ibérico que se divulgou também nas partes de colonização espanhola na América.

Nossa cantoria de rabeca e violão terá também músicas de Zé Côco do Riachão, Antenógenes Silva, Beira D'Água; poesias caboclas de Zé Laurentino e Pompílio Diniz; e cordel de José Pacheco e do maior de todos os poetas populares: Leandro Gomes de Barros.

Gostaria de agradecer ao meu compadre Evandro Navarro e também ao Lélo pelo convite feito.

TRAVESSIA: Do Romanceiro à Villa-Lobos
Jeziel Paiva: rabeca, viola de arco, causos, poesias caboclas e cordel
Antônio De Vito: Violão
Local: Capela da USP
Horário: 12:30 horas
Entrada franca


Inté.

20.6.07

39º Festival de Inverno da UFMG

Agência FAPESP – Estão abertas até 30 de junho as inscrições para o 39º Festival de Inverno da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), que será realizado de 15 a 28 de julho, em Diamantina (MG).

O evento, que terá o tema "Territórios Contemporâneos: Linguagens Híbridas", contará com a realização de oficinas, mostras, exposições, instalações e workshops.

Artes audiovisuais, artes cênicas, artes plásticas, artes literárias, artes musicais e artes transdisciplinares serão as áreas temáticas do encontro.

Mais informações: http://www.ufmg. br/festival

18.6.07

Orquestra Jovem nos 151 anos de Ribeirão Preto

Meus compadres e comadres.
Neste 19 de junho quando Ribeirão Preto faz 151 anos o Centro Cultural Campos Elíseos participa dessa festividade. Seus grupos musicais de alunos estarão se apresentando no Teatro de Arena e no Teatro Municipal à partir das 10 horas da manhã. Gostaria de convidar a todos para assistirem nossas apresentações e da Orquestra Jovem do Centro Cultural, da qual faço parte como maestro e professor, que apresentará um repertório muito bonito com obras de Villa-Lobos, Ernani Aguiar, Luiz Gonzaga, entre outros. A meninada está tocando como gente grande. Nossa apresentação está prevista para as 10:30 no Teatro de Arena. Não percam!

16.6.07

A Saga das Mãos

Meus compadres e comadres

Ontem foi uma noite especial para muitos e especialmente para mim e meu companheiro de militância cultural Antônio De Vito. É que o SESI trouxe à Ribeirão Preto a Bachiana Chamber Orchestra, regida pelo grande músico João Carlos Martins que se apresentou no Theatro Pedro II.

Na oportunidade foi exibido um filme mostrando aos presentes a maquete do Teatro Popular do SESI que será construído brevemente em Ribeirão Preto.

Foi uma noite muito agradável, pois pude rever velhos amigos entre eles Ênio Antunes Santos, integrante da Bachiana Chamber Orchestra e velho companheiro de jornada desde os tempos da Bahia e dos Festivais de Verão de Uberaba na década de 80.

João Carlos Martins é uma figura carismática, extremamente agradável e simpática. Um contador de causos. Levados ao seu camarim por Ênio Antunes, o famoso Brejeiro, eu e Antônio de Vito fomos recebidos pelo maestro como se fôssemos velhos conhecidos dele. Estávamos diante do maior interprete do maior compositor da história da música.

“Pouca gente, no Brasil, tem tanta afinidade com Bach quanto João Carlos Martins. Em seus tempos de pianista, ele gravou toda a obra para teclado do compositor alemão. Na sua nova carreira de regente, ele montou uma orquestra, sintomaticamente, chamada de Bachiana Chamber Orchestra. E seus dois primeiros lançamentos fonográficos como maestro contemplam, não por acaso, obras de Bach: as Suítes Orquestrais e os Concertos de Brandemburgo.

Uma tarefa relativamente simples para um intérprete que começou a tocar Bach, ao piano, aos oito anos de idade, e sete meses depois já vencia o concurso da Sociedade Bach de São Paulo, tocando as Invenções a Duas Vozes do mestre do barroco alemão.

Teve vários "momentos bachianos" memoráveis, mas se lembra com especial nostalgia da apresentação de inauguração do Glenn Gould Memorial, em Toronto, em março de 1983, pouco tempo depois do falecimento do pianista canadense.

"Entrei no palco, com uma recepção fria", recorda. Depois, o público foi sendo ganho, gradativamente, e, no final, com Artur Moreira Lima e Emil Gilels na platéia, João Carlos Martins deu um número recorde de bis: nada menos que 14. "O pai do Glenn Gould veio me dizer que o filho dele me admirava", lembra, emocionado”.

Mas o que emocionou a todos ontem no Theatro Pedro II foi rever João Carlos Martins sentado ao piano e tocando com três dedos (dois da mão esquerda e o polegar da mão direita).

Para quem não sabe, o mestre foi vitimado por alguns traumatismos físicos que lhe causaram atrofia dos movimentos dos dedos impondo-lhe uma luta constante e dolorosa de superação. Depois de reger a orquestra tocou ao piano divinamente músicas de Bach, Tom Jobim e o Hino Nacional acompanhado por seus músicos.

Sua saga é mostrada em documentário feito para o cinema por Irene Langemann numa produção franco-alemã.

E seu livro “A Saga das Mãos” pode ser adquirido em seu site www.joãocarlosmartins.com.br

Ricardo Feltrin, Editor-chefe da Folha Online escreveu o artigo que publico a seguir.

"A Paixão Segundo Martins" ilumina o maior dos pianistas brasileiros

Além de ser um dos mais belos documentários sobre músicos já realizados no cinema, "Paixão Segundo Martins" também poderia ser definido como uma história de amor ou mesmo um drama.

É a história de amor de João Carlos Martins por Johann Sebastian Bach e pianos. É o drama de um pianista em permanente luta contra o destino e a dor, que teimam em maltratar seus bens mais preciosos, suas mãos.

Há várias qualidades que tornam imprescindível essa produção franco-alemã de Irene Langemann sobre o maior pianista brasileiro de todos os tempos. Sim, ele foi superior ao que Nelson Freire é embora o estilo sejam totalmente diferentes.

A primeira qualidade é o personagem em si. João Carlos Martins é uma figura tão carismática e brilhante que qualquer período de sua vida poderia ser transformado num documentário em separado.

Suas idiossincrasias durante as gravações; seu jeito louco de ensinar; sua obsessão em treinar ao teclado até 20 horas por dia, inclusive sábados, domingos e feriados; seu prazer pessoal pelo timbre dos pianos Baldwin (e não pelos Steinway); sua coragem em enfrentar tratamentos médicos dolorosíssimos para continuar a tocar mais um pouco... tudo isso poderia ser um filme novo sobre a vida do músico.

A segunda qualidade é a trilha sonora. Afinal, estamos falando não só de um pianista genial, mas também de Bach (1685-1750) --o divisor de águas da música, o engenheiro barroco que não apenas bem temperou o cravo, mas toda a história e significado da composição.

Sem Bach, João Carlos Martins talvez não existisse.

Por fim, o maior dos atrativos do filme: a sinceridade do músico, a forma com que ele abre sua vida e seus sentimentos à câmera, bem como assume seus erros, como o envolvimento de sua empresa Pau Brasil numa das campanhas eleitorais de Maluf, ou seu fracasso emocional em vários casamentos. Nada é omitido.

Ao final, o filme emociona a platéia, que vê como o pianista ainda sente mais dor com o massacre político a que foi submetido do que com as terríveis infiltrações de botox na palma para recuperar movimentos dos dedos de uma só mão, porque a outra já estava "morta”.

João Carlos, então, reivindica justiça não para si, mas para sua obra. E mais que qualquer pessoa, é a música que o absolve. O Brasil ainda deve reconhecimento ao seu talento, significado e obra.

Um Convite Irrecusável

Mas passado o concerto e o memorável encontro com João Carlos Martins foi a vez de ciceronear meu amigo Ênio Antunes, carinhosamente chamado por mim de Brejeiro.

Fomos tomar uma, matar a saudade dos velhos tempos e fazer planos para um futuro em curto prazo.

Eu explico: Ênio Antunes tem se destacado no cenário musical brasileiro principalmente na área acadêmica onde tem se dedicado na formação e preparação de jovens instrumentistas e práticas de conjuntos. É diretor artístico e regente titular da Orquestra Antunes Câmara, coordenador pedagógico e regente adjunto da Bachiana Jovem e professor e regente titular da Camerata FAAM (Faculdade Alcântara Machado).

É o idealizador do projeto “Arte do Som – Escola e Estilos” que acontece em São Paulo capital. Segundo ele esse projeto é um suporte na formação musical e profissional dos estudantes de música com foco nas manifestações culturais e principalmente no entendimento da estética musical.

Além das aulas e trabalhos de pesquisas são realizados workshops dirigidos por professores e artistas de reconhecimento internacional com objetivo de desenvolver o aprendizado da forma mais ampla considerando a compreensão de estilos, formas e características interpretativas da música dos mais diferentes períodos históricos.

Pois bem. Eu precisei relatar isso para dividir com meus compadres e comadres minha alegria de ter sido convidado por Ênio Antunes para me apresentar em São Paulo dentro de seu projeto.

Fiquei feliz por dois motivos: um de ter recebido do mestre Ênio Antunes o reconhecimento por meu trabalho e outro de constatar sua preocupação com a formação cultural plena de seus alunos, pois ao estar levando a cultura popular brasileira para ser vivenciada pelos participantes do projeto demonstra sua vontade de não deixar que os vínculos culturais sejam perdidos.

As barreiras foram feitas para serem transpostas e a cultura popular com causos, poesias caboclas, cantoria e cordel vai transpondo muros e misturando a rusticidade da rabeca com a sofisticação de violinos, violas de arco e violoncelos. Isso será o resultado dessa ação artística e cultural que acontecerá em São Paulo a partir de agosto deste ano graças ao convite que me foi feito pelo professor Ênio Antunes.

15.6.07

TEIA materializa-se em Belo Horizonte em 2007

A TEIA, o maior encontro da diversidade cultural no Brasil, reunirá, em novembro, em Belo Horizonte, os Pontos de Cultura participantes do Programa Cultura Viva, do MinC, e terá centralidade, neste ano, na relação entre Cultura e Educação.

Eduardo Carvalho*

A TEIA, o maior encontro da diversidade cultural no Brasil, reunirá, em Belo Horizonte, em novembro, os Pontos de Cultura participantes do Programa Nacional de Cultura, Educação e Cidadania – Cultura Viva, do Ministério da Cultura, e terá centralidade, neste ano, na relação entre Cultura e Educação.

Em abril de 2006, realizou-se a primeira edição da TEIA, no Pavilhão da Bienal de São Paulo. A primeira celebração pública e presencial dos Pontos de Cultura, pontapé inicial de um processo de vivência e participação para a construção pública do Programa Cultura Viva. O mote “Venha Se Ver e Ser Visto” abarcou a Economia Solidária como eixo conceitual propositivo.

Naquela ocasião, já havia 443 Pontos de Cultura conveniados, dos quais 400 participaram da mostra. Hoje, já se contam 511 Pontos conveniados diretamente com o MinC e mais 168 conveniados a partir das Redes de Pontos, em um total de 679 Pontos de Cultura. No próximo encontro, a ser realizado em Belo Horizonte, entre os dias 7 e 11 de novembro de 2007, já serão mais de 800 Pontos de Cultura em todo o Brasil.

A proposta de um encontro presencial dos Pontos de Cultura corresponde aos esforços do Ministério da Cultura de construir de forma sistematizada, organizada e democrática, uma política pública de cultura para o país respaldada e orientada pelo Plano e pelo Sistema Nacional de Cultura. Desde o processo de idealização até a distribuição de atividades dos mais de 650 Pontos que deverão estar presentes, tudo busca a articulação de todos, em uma iniciativa do poder público, via os ministérios da Cultura, Educação, Trabalho e Turismo, articulada pela sociedade civil e viabilizada por patrocínios de empresas privadas e públicas. A fim de expressar esta dimensão participativa plural, o lema escolhido para a TEIA neste ano foi Tudo de Todos.

Além do encontro presencial, o Fórum Nacional dos Pontos de Cultura trabalhará virtualmente a partir da Plenária Virtual, no site da TEIA (www.teia2007.com.br). O debate determinante de relação e pensamento do futuro dos Pontos de Cultura acontece em todo o processo da TEIA sob a perspectiva da construção de plataformas democráticas de participação, tendo em vista a necessidade da conquista de autonomia, protagonismo e empoderamento da TEIA para além da construção que hoje ainda é articulada pelo Ministério da Cultura. Além da realização do encontro em si, a TEIA deste ano lança as bases metodológicas para que, em 2008, os Pontos de Cultura participem ativamente de todo o processo, desde a elaboração até a execução do projeto que determina o encontro anual dos pontos.

Os Territórios
Organizados por meio de um processo colaborativo que envolve uma rede independente de empresas culturais, os espaços que compõem a TEIA em Belo Horizonte estão divididos para abrigar, tematicamente, cinco Territórios: Expressão, Diálogo, Práxis, Trabalho e Celebração. A construção dos Territórios determina a divisão dos elementos que compõe a TEIA, não necessariamente em uma repartição espacial e geográfica, mas conceitual, simbólica.

Estes cinco campos conceituais são perpassados por temas transversais mais abrangentes, notadamente a relação entre Cultura e Educação, além da forte presença da Economia Solidária, mote da TEIA em 2006. O encontro buscará sempre aproximações entre ações que se desenvolvam com a consciência social que incorpora referências simbólicas no processo de construção da cidadania e com os processos de exploração, uso e apropriação de códigos de diferentes meios e linguagens artísticas e lúdicas nos processos educacionais, pretendendo, com isso, ampliar o acesso aos meios de formação, criação, difusão e fruição cultural por meio da ação de agentes culturais, arte-educadores, educadores de rua, artistas, professores e cidadãos que entendem a cultura no seu sentido mais amplo - como direito, comportamento e economia. Além, é claro, dos aspectos ligados à potencialização de energias sociais e econômicas para o desenvolvimento de uma cultura cooperativa, solidária e transformadora.

Os principais espaços de prática política da TEIA são os territórios do Diálogo e o da Práxis. Partindo do princípio de que as formas de fazer dos Pontos são geradoras de uma qualidade de conhecimentos ainda pouco difundidos, a intenção é partir para a tomada de consciência de que é preciso decodificá-los para articular os saberes que eles representam. Assim, é fundamental o Diálogo, como resultado de um processo de cooperação e de trabalho conjunto para construir um significado comum a todos os interlocutores.

Nessa lógica, o Seminário Internacional Saberes Vivos terá o objetivo de provocar a troca dos saberes acadêmicos com os dos Pontos. O espaço Conversê, por sua vez, será o ponto de encontro, reuniões, articulações e contatos entre os Pontos, com suporte multimídia de registro e difusão.

No terreno da Expressão, acontecerá o Fórum Nacional dos Pontos de Cultura, que reunirá todos os Pontos para desenvolver a agenda política do Programa Cultura Viva. Além disso, será organizada a Mostra ArteViva, que pretende resignificar o conceito de arte para além da visão elitista e/ou européia.

O Território do Trabalho abrigará o Mercado Criativo, um novo conceito de vitrine para os produtos provenientes dos Pontos, organizado para reuni-los pelos tipos de manufatura que desenvolvem, e não por estados, o que propiciará o melhor aproveitamento na troca de saberes. A Feira de Economia Solidária também estará presente e integrada à TEIA com um conceito ativador das capacidades produtivas dos Pontos, numa nova visão de economia e desenvolvimento para o país. Já o Palco em Obras será uma das grandes atrações de público, unindo em apresentações artísticas músicos consagrados em diálogo com artistas dos Pontos.

E o último fio da TEIA é o da Celebração. Nele, o Circo Brasil será um palco aberto e administrado pelos Pontos para manifestações artísticas dos Pontos de Cultura. Uma programação especial promete ainda uma grande Parada da Diversidade Cultural e a elaboração do Circuito Cidade Viva, a fim de promover a integração da cidade e de sua população com os visitantes de todos os cantos do país. Um restaurante será especialmente montado para alimentar os mais de 5 mil agentes culturais que participarão do evento.

Belo Horizonte, capital mineira, foi escolhida para acolher o maior encontro da diversidade cultural no Brasil por concentrar, em uma área pequena, os necessários aparelhos culturais para garantir a proposta de Tudo de Todos, acolhendo os diversificados tipos de atividades que comporão o encontro presencial dos Pontos de Cultura. Oito locais na região central do município formarão um amplo corredor cultural, ocupando a Casa do Conde, a Estação do Conde, o Centro Cultural UFMG, a Praça da Estação, o Museu de Artes e Ofícios, a Serraria Souza Pinto, o Teatro Francisco Nunes e o Palácio das Artes.

(*) Além de editor de Arte & Cultura na Carta Maior, Eduardo Carvalho também coordena o trabalho do 100canais - núcleo editorial de jornalismo cultural independente, parceiro de Carta Maior e responsável pelo conteúdo do site da TEIA.

12.6.07

"Lei de Incentivo é sistema perdulário e injusto"

Meus compadres e comadres. Abaixo transcrevo entrevista de Yacoff Sarkovas ao Portal Carta Maior onde fala sobre leis de incentivo à cultura

Ele diz que "Lei de incentivo é sistema perdulário e injusto", e acusa o Ministério da Cultura de ter organizado fóruns pelo Brasil para discutir apenas mudanças cosméticas na lei, pois não quis enfrentar lobbies midiáticos.

Por Edson Wander

A incapacidade e até mesmo a perversidade do sistema de leis de incentivo baseadas em renúncia fiscal é uma noção que cresce de maneira inversamente proporcional à capacidade dos agentes públicos de mudá-lo. Além de perversas, as leis de incentivo são perdulárias, injustas e deseducam o empresariamento no trato do apoio cultural. Esse diagnóstico das leis de incentivo cultural no Brasil é de Yacoff Sarkovas, especialista e consultor de empresas na área de imagem corporativa e projetos culturais, sociais, ambientais e esportivos. Crítico mordaz da legislação que trata cultura como objeto de renúncia e até lucro fiscal subreptício, Sarkovas é o nome por trás da reengenharia dos programas culturais de empresas como Petrobras e Natura. Engenheiro eletrônico que passou a trabalhar no meio cultural, Sarkovas falou à Carta Maior sobre o quadro atual da legislação de fomento à cultura no Brasil e revelou, entre outras coisas, que o Senado discute um projeto que pretende revalidar a legislação de incentivos culturais via renúncia fiscal, que caducou ano passado. Leia os principais trechos da entrevista:

CARTA MAIOR - O que há de errado com as leis de incentivo à cultura no Brasil?

YACOFF SARKOVAS - É melhor começar perguntando o que há de certo, porque só há uma coisa certa nas leis de incentivo que é a transferência de dinheiro público para a cultura. Isso é positivo porque a cultura é uma questão de interesse público e, portanto, precisa de recursos públicos e só, pronto, acabou: a partir daí está tudo errado. É um sistema perdulário e injusto. É perdulário porque cria uma cadeia desnecessária de intermediação. Ao invés de o dinheiro sair em linha direta do caixa público para a ação cultural, cria-se uma cadeia de intermediação porque, para a busca desse recurso em meio a milhares de empresas, exige-se uma série de captadores, gente especializada em formulação de projetos e corretagem, o que dá margem a processos de corrupção. É perdulário também porque, no uso do dinheiro público, as empresas aplicam para fins que nada têm de interesse público. E ele é injusto porque ele não estabelece uma relação entre dinheiro público e interesse público. Isso faz com que, por exemplo, o filme a ser financiado seja o A e não o B. Os critérios passam a não ser justos e, então, chega-se a uma situação mais do que perdulária e injusta. Chega a ser absurda, surreal, como no caso da Lei do Audiovisual. Essa lei é um dos maiores escândalos culturais produzidos nesse país.

CM - Por quê?

YS - Você sabia que, quando você entra no cinema e vê aquela marca na abertura dos filmes, você está pagando para aquela empresa usar aquela marca naquele filme? O desconto via lei, nestes casos, chega a 132%, ou seja, aquela marca que abre o filme pegou R$ 1 milhão de reais do dinheiro público - porque ela não pegou um centavo do bolso dela - e deu para aquele filme acontecer. Em troca, pediu uma série de benefícios, inclusive aquele benefício de imagem. Além de ela deduzir do imposto o R$ 1 milhão que ela "deu", ela deduz também R$ 320 mil porque lança como despesa, aquilo se abate sobre o lucro e, na incidência, vira lucro. O poder público, o Estado brasileiro, paga para que empresas privadas decidiram onde se vai colocar o dinheiro público em forma de incentivo cultural, é assim que tem que ser vista a Lei do Audiovisual. A população brasileira não sabe disso, o cidadão brasileiro não sabe disso e precisaria saber.

CM - Então o modelo ideal é o financiamento direto?

YS Totalmente, não há nenhuma dúvida nisso. É assim que acontece no mundo inteiro e assim que acontece no Brasil em outras áreas, como científica, acadêmica, por exemplo, a de pesquisa. Como é que se concorre a recursos públicos na área de Biologia e Física por exemplo? Entra-se nos órgãos e institutos públicos afins que vão medir a competência do candidato por mérito técnico e mérito de política pública. Então, são critérios que fazem parte de uma estratégia pública de pesquisa, a cultura também deveria ter isso. Qual é a estratégia pública para fomentar a dança instrumental no Brasil? Qual é a estratégia pública que temos para gerar processos de inclusão cultural ou de democratização de acesso à cultura. Existe uma série de questões na área cultural que só o poder público pode dar conta.

CM - Mas não há experiências eficazes de incentivo cultural via fisco em outros países?

YS Há claro, mas não tem nada a ver com o que a gente chama de incentivo fiscal no Brasil. Lá fora é assim, como nos Estados Unidos, por exemplo, o cidadão mora em Nova York e vai muito ao Metropolitan porque acha o espaço um patrimônio da cidade e resolve ajudar o Metropolitan. Então ele dá 100 dólares por ano para o Metropolitan e desconta no seu Imposto de Renda. Mas, veja bem, a idéia é ele descontar 100 dólares do seu incentivo cultural, é deixar de pagar por essa doação e não receber por essa doação, como é facultado aqui como possibilita a Lei do Audiovisual de permitir as empresas até a lucrar 32% sobre o incentivo dado.

CM - Se é tão evidente os malefícios da lei por que não se consegue mudá-la?

YS Mudar a lei não é mexer em dois, três artigos dela, mas mudar o sistema de financiamento público à cultura. É fazer com que se substitua o sistema de dedução fiscal por um sistema de fundo de financiamento público e, a médio prazo, desaparecer com as leis de renúncia fiscal. Mas falta interesse e é importante que se diga que o governo Lula, com o Ministério do Gilberto Gil, endossa esse sistema de renúncia fiscal como sistema válido como modelo de financiamento público. O Ministério da Cultura organizou uma série de fóruns pelo Brasil para discutir mudanças cosméticas na lei.

CM - O argumento do Minc é que há entraves políticos para a mudança...

YS Por entraves políticos leia-se peitar pequenos lobbies, isso é que são entraves políticos. São lobbies poderosos apenas para gerar impacto midiático. Na verdade, a coluna do ministério neste aspecto foi quebrada logo no início do governo por um golpe midiático feito por alguns cineastas que revidaram um edital redigido de uma forma incompetente por uma estatal, colocando a necessidade de contrapartidas sociais para futuros projetos que viessem a ser contempladas por ela. Na verdade, foi um golpe midiático porque, por trás daquilo, não havia nenhuma crítica consistente. Enfim, é bom que se diga que, com Gil ou sem Gil, o staff técnico do ministério tem o diagnóstico completo disso sobre o que eu estou falando, lá todos sabem disso melhor do que eu e você. Outra: o Gil levou para o Ministério gente que tem uma visão crítica de todo esse processo que foram para lá dispostos a mudar isso, mas caíram na vala comum.

CM - Como o senhor avalia a participação privada nas ações de patrocínio cultural no Brasil?

YS Patrocínio é uma questão de comunicação empresarial, esquece lei de incentivo, cultura etc., é apenas uma forma de uma marca se comunicar. E, hoje, o próprio mercado está levando as empresas a se comunicarem de uma forma associativa: ela associa sua imagem a conteúdos que tenham valor para os seus públicos. Isso pode acontecer no campo cultural, esportivo, social, ambiental etc. Essa estratégia é adotada no mundo todo e no Brasil e desenvolve-se a cada ano. Atualmente, 19% dos orçamentos de comunicação das grandes empresas brasileiras são investidos nessa estratégia, e isso vai continuar crescendo nos próximos anos. Mas, com a criação das leis de incentivo, surgiu um dinheiro que não é deste orçamento, então as empresas usam dessas benesses, claro, pois está previsto em lei. Chegamos, com isso, a uma outra perversão da lei de incentivo cultural via dedução fiscal, que é a de deseducar o empresariado. É como se você dissesse para ele que não precisa usar o dinheiro dele para vender a sua imagem. E isso, infelizmente, criou uma dependência crescente desse processo. Hoje, do total de investimentos das empresas na cultura, 67% vem do uso das leis de incentivo fiscal. Ou seja, são 67% de recursos que usam leis de incentivo contra 33% que não usam. Outro dado: 80% das empresas brasileiras que fazem patrocínios culturais usam os benefícios da lei.

6.6.07

Víctor Jara, o músico das mãos decepadas por Pinochet

O sangrento golpe militar do Chile, em 1973, deixou um saldo de mais de 15 mil mortos, 30 mil prisões e centenas de torturados. Entre as vítimas da barbárie pinochetista, estava Víctor Jara, jovem poeta e compositor de música popular, líder da Nueva Canción - movimento que pertence à estética da música de protesto.

Além de grande e inventivo artista, Jara era militante das Juventudes Comunistas. Em 1970, na campanha de Salvador Allende para a presidência do Chile, realizou recitais em todo o país. São dessa época canções engajadas, como El Manifiesto e La Plegaria de un Lavrador.

Com Allende eleito, Víctor Jara assumiu um papel preponderante no desenvolvimento cultural e político do país. Foi¬lhe outorgado o cargo de embaixador cultural do governo da Unidade Popular, que desempenhou de 1971 até à sua morte. Na qualidade de embaixador cultural, levou o seu canto a importantes palcos mundiais.

Em 1972, realizou uma volta musical à União Soviética e a Cuba. Foi convidado, no mesmo ano, para o Congresso de Música Latino-Americana, organizado pela Casa das Américas, em Havana. Em seu regresso ao Chile, dirigiu a homenagem que se fez ao poeta Pablo Neruda depois de este receber o Prêmio Nobel de Literatura.

No dia 11 de Setembro de 1973, durante o golpe militar, Víctor Jara foi detido com um grupo de professores e 600 alunos que se encontravam na Universidade Técnica do Estado. Depois da sua apreensão, foi levado ao Estádio Nacional de Santiago - que os militares utilizaram, naqueles dias sombrios, como campo de concentração.

Jarra não obedeceu à ordem militar de parar de tocar seu violão. Teve assim suas mãos decepadas - e misturou gritos de dor com alguns versos de protesto de sua autoria. Foi o bastante para que um insano militar calasse Jarra com um tiro em sua cabeça, ceifando a jovem vida de um grande talento.

Uma testemunha relata que os algozes, ao cortarem as mãos do músico, lhe teriam dito: "Agora pode tocar violão". Dias depois, sua mulher, Joan Jara, identificou o corpo dele, fuzilado e com as mãos amputadas. No estádio, Victor ainda escreveu seu último poema, no qual transparece toda a sua dor e sofrimento, a um passo da morte, contemplando com profunda tristeza o que acontecia com seu país:

"É este o mundo que criaste, meu Deus?
Para isto os teus sete dias de assombro e trabalho?
Como me sai mal o canto quando tenho que cantar o espanto!
Espanto como o que vivo.
Como o que morro, espanto".

Em 1990, a Comissão Verdade e Reconciliação reconheceu que Víctor Jara foi ferido de morte no dia 16 de Setembro de 1973, no Estádio Nacional de Santiago. Seus restos descansam no Cemitério Geral.

O poema a seguir foi citado no primeiro número da revista da Apropuc, inteiramente dedicado ao músico, poeta e compositor chileno. Segundo a publicação, "essa homenagem se estende a todos os artistas que emprestam ou emprestaram seu talento à luta social, à causa dos trabalhadores e, por esse motivo, foram oprimidos, torturados ou assassinados".

Canto para as Mãos Partidas de Víctor Jara
(Por Pedro Tierra)

Quisera chorar teus dedos dilacerados:
Raízes do meu canto subterrâneo.

Quisera chamar-te "Hermano"
Como a infância dos rios
Lava o rosto da terra,

Mas minha boca sangrava
Um silêncio de canções amordaçadas.

De tuas mãos se dirá um dia:
Geravam pássaros de sangue
Como as primaveras da lua.

Tuas mãos,
Tristes descendentes das canções araucanas,
Tuas mãos mortas,
Casa de canções decepadas,

Tuas mãos rotas,
Últimas filhas do vento,

Guitarras enterradas sem canto,
Sementes de fuzis,
Seara de sangue.

Quisera entregar
Minhas mãos inúteis
Ao cepo de teus carrascos.


Fontes: Rebelión, Adital e Site da Apropuc

4.6.07

A Funarte, as Políticas Públicas de Cultura e a Democracia

Celso Frateschi, recém-empossado presidente da Funarte, fala sobre as políticas que pretende desenvolver na gestão do órgão e da necessidade de afinar a parceria entre a entidade, o Governo e o Ministério da Cultura.

Celso Frateschi é ator, diretor e autor teatral, ator de televisão e cinema e produtor de cinema, e já soma mais de trinta anos de carreira. No campo acadêmico, atualmente é professor licenciado da Escola de Artes Dramáticas da Universidade de São Paulo, da qual também era vice-diretor. Na gestão pública, já foi secretário de Cultura em Santo André e, em São Paulo, durante a gestão Marta Suplicy, foi diretor do Departamento de Teatro e, em seguida, Secretário Municipal de Cultura. Desde o final de abril, é o presidente da Fundação Nacional de Arte (Funarte), órgão independente ligado ao Ministério da Cultura e responsável por tornar reais boa parte das políticas por ele geradas.

Em sua atuação como gestor, Frateschi realizou projetos de fomento ao teatro e à produção cultural na periferia, trabalhou uma agenda conjunta com a Secretaria de Educação, especialmente nos CEUs, e criou o Museu Afro-brasileiro. De seu gabinete na Funarte, falou-nos sobre as diretrizes da cultura na gestão Lula/Gil, de democracia participativa, de fomento aos produtores independentes, teceu elogios ao programa Cultura Viva e críticas à estrutura de direção da própria Funarte, além de apontar alguns malefícios do atual modelo de fomento à Cultura.

Leia os melhores momentos da entrevista concedida a Guilherme Jeronymo*, repórter do 100canais - núcleo editorial de jornalismo cultural independente, parceiro da Carta Maior:

100canais – Parte da imprensa noticiou que o senhor assumiria a presidência da Funarte com carta-branca do Ministro Gilberto Gil. O que isso significa? Como ela se traduzirá no seu projeto para a Funarte?

Celso Frateschi – Em primeiro lugar, eu nunca pedi, portanto nunca recebi, nem me interessa receber carta-branca do ministro. Pelo contrário, quero o envolvimento do Ministério e do ministro em todos os projetos que for realizar aqui na Funarte. A carta-branca, se me dá liberdade, ao mesmo tempo tira o compromisso daqueles que eu quero que se comprometam a fazer os projetos comigo.

Em política, não tenho interesse em desenvolver um projeto pessoal, e não propus projetos pessoais quando estive nos governos de Santo André e de São Paulo. Entro nesta gestão por acreditar no projeto coletivo por ela proposto, e não tenho pretensão, expectativa ou querência de ter carta-branca. Acho que tem sim uma contribuição pessoal minha, algo com que eu possa colaborar, mas isso dentro de um projeto coletivo. Tenho sim muita liberdade de propor e de executar, como também muito compromisso com este projeto.

100 - O senhor já afirmou, em entrevista anterior (leia aqui entrevista com este repórter na Carta Maior), acreditar em dois pontos de vista diferentes para se encarar o processo da cultura: como direito de cidadania ou como atividade econômica. A última gestão da Funarte, até por ter tido a tarefa de praticamente se reerguer do nada, privilegiou a estruturação econômica, inclusive com uma política setorialista. O plano agora é o de aprofundar essa visão, estruturando-a melhor, ou o de diversificá-la, pensando no acesso do cidadão também aos bens de produção de cultura?

CF - O tripé do governo Lula em Cultura, capitaneado pelo Gil, define três grandes linhas: o desenvolvimento da cultura na questão simbólica, a cultura como direito de cidadania e a cultura como atividade econômica. A equação que o governo propõe coloca essas três dimensões do trabalho cultural interagindo e alimentando-se, provocando-se mutuamente. Não concordo que o Grassi [Antônio Grassi, presidente anterior da Funarte] tenha inclinado-se de maneira desequilibrada a essa parte econômica. Foi uma preocupação, mas se ele pretendeu desequilibrar foi para o lado da cidadania cultural ao reavivar a Funarte com projetos amplos procurando atender o Brasil como um todo e em várias áreas artísticas. Não pretendo mudar essa linha, nem me contrapor a esse tripé. Pelo contrário. E pretendo colocar minha experiência para desenvolver isso da forma mais ampla possível.

Num primeiro momento analisamos os editais da gestão anterior, e agora estamos priorizando a federalização, com iniciativas como a de realizar prêmios que tem disputa por Estado, não deixando prevalecer a concentração de prêmios e verbas em projetos do eixo RJ-SP. Os projetos de um determinado Estado disputarão entre si. Não chegamos a uma versão definitiva deste modelo, mas avançamos bastante. Uma coisa é certa: para desenvolver as três vertentes, será necessário trabalharmos integrados com o Ministério e com o Governo como um todo.

100 - Quão independente é a Funarte para fugir da lógica do estímulo à produção dependente das leis de fomento?

CF – Sabe, nós precisamos relativizar um pouquinho esse conceito de dependência ou independência. Nós temos interesse inclusive de intervir na lógica dos Programas Nacionais de Cultura, e já intervimos em sua prática. O Pronac, por exemplo, tem boa parte dos pareceres vindos da Funarte, ficando as decisões para o CNIC e, em última análise, para o Ministro. Se nos colocarmos como independentes, acabaríamos não participando dessas discussões de critérios da Lei Rouanet e de formas para melhorá-la. Isso não pode acontecer, pois queremos estar dentro do Governo, sugerindo ações e propostas para que a arte e a cultura estejam em pauta no conjunto do Governo, assim como queremos ser permeados também pelo governo. Hoje, a Cultura é discutida de uma forma estratégica. A participação do ministro em pautas como a da TV Pública demonstra isso.

É preciso uma certa independência sim, para que não haja interferência das outras áreas na atuação do artista. Estamos num processo, num momento, em que a Cultura já não é tratada mais como apêndice da educação. Mas isso não significa que não devemos ter um trabalho orgânico com a educação. A cultura por muito tempo foi vista como uma ação meramente ligada a eventos, como uma ação cultural ou institucional, de governo ou de empresas. São ações que limitam a função artística, e que estamos superando. São ações muito visíveis, principalmente quando a cultura vira subproduto, quando, na verdade, ela é o produto principal, não precisando travestir-se de nada para ser importante ou estratégica.

100 - Como a Funarte articula-se e qual seu potencial de articulação com políticas externas à sua estrutura como a lei Rouanet, os Funcines e o Fundo de Cultura?

CF - Ela tem institucionalmente essa função. Agora, nem sempre ela pode fazê-lo. É preciso lembrar que a Funarte foi destruída no governo Collor e abandona na gestão FHC. Mas ela tem, sim, como interferir nas discussões do Programa Nacional de Apoio à Cultura - Pronac e da Comissão Nacional de Incentivo à Cultura - CNIC, por ser quem avalia a maior parte dos projetos que pedem recursos em seu âmbito. Estamos discutindo as Instruções Normativas que definem as políticas de fomento e tendo assento nestes fóruns, dos quais, antes, não participávamos. Agora, nesta gestão, parece-me que estamos conseguindo um trânsito bastante positivo no conjunto do Ministério da Cultura e de suas secretarias.

100 – Neste sentido, o recente Requerimento 69/2007 da Comissão de Educação e Cultura da Câmara, de autoria do Deputado Paulo Rubem Santiago, convidando o senhor e uma série de Secretários do MinC e os presidentes da Ancine e do Iphan para debater o Plano Nacional de Cultura é uma atitude positiva?

CF - Claro que é positiva. É fundamental que estejamos numa instância tão importante quanto a Câmara, nem que seja para explicitar nossas mazelas e dificuldades todas num órgão que pode ser um grande aliado para desenvolver nossas ações.

100 - É demais imaginar uma Funarte como mais do que uma “agência” de fomento, indo um passo além da reestruturação que marcou os últimos quatro anos e atuando como geradora, articuladora e executora de políticas publicas, inclusive atuando na proposição de um modelo político para as artes?

CF – A questão é que, como agência de fomento, ela é geradora e executora também. Mas esse é, sem dúvida, apenas um dos aspectos da Funarte, e todo o esforço do Ministério é para que ela atue na formulação de políticas públicas estruturantes para o futuro do país. A nossa missão é executar de uma maneira mais efetiva o Plano Nacional de Cultura e o Sistema Nacional de Cultura, já consagrado em discussões na gestão anterior deste governo. A Funarte vai ter uma grande participação na efetivação das políticas, e isso significa discutir e ter planos conjuntos com Estados e municípios seja com os editais da Funarte, seja com os Pontos de Cultura. Agora, o esforço é o de alcançar a consagração definitiva do Sistema e do Plano.

100 - Como a greve dos servidores da Cultura, baseada sobretudo no Rio de Janeiro, afeta a Funarte, qual a posição da Fundação e que desafios ficam evidenciados?

CF - É evidente que a greve afeta de uma maneira bastante importante as atividades da Funarte. E é esse o sentido dela. Ela é uma ação para que o Governo, como um todo, responda às manifestações e o Ministério tem se posicionado de maneira bastante explícita como favorável às reivindicações dos funcionários, que estão sendo discutidas com o Governo. O Ministério tem pressionado para que essa negociação com o Ministério do Planejamento seja realizada, e torne-se possível o cumprimento do acordo realizado entre servidores e Governo em 2005. Temos uma relação bastante “civilizada” com os funcionários da Cultura em todos os locais onde atuamos, e essa greve nos prejudica bastante.

100 - Quais a sua visão da abrangência do programa “Cultura Viva” em sua utilização como campo de articulação de políticas que visem à “cidadania” por meio da arte, articulada com a educação e com perspectivas de sustentabilidade econômica?

CF – Acho que o Cultura Viva é o grande sucesso da gestão Gil, e ele vem se implantando com uma rapidez muito grande. Passa aos poucos a ter um caráter mais federativo e a posição do Célio Turino tem sido muito positiva neste sentido. É um programa amplo, completamente não restritivo no sentido de linguagens e de formas e que, por isso mesmo, tem muito o que expandir. A tendência é ganhar uma escala federal maior do que a que atingiu até agora.

100 - Como pode este programa levar em conta as necessidades culturais da população sem deixar de levar em conta as necessidades dos produtores? Qual destes setores é melhor contemplado?

CF - São setores que podem ter um atendimento complementar neste projeto, mas o Cultura Viva não tem como objetivo os produtores. Ele está preocupado com outras coisas, e talvez seja o programa em que a cidadania cultura é mais atendida. Quanto ao produtor, há projetos, a própria Lei Rouanet e editais, voltados para eles. O Cultura Viva parece-me um projeto bastante amplo em que o produtor também se inclui, quando engajado, em resolver as questões propostas pela população.

Mas isso depende da forma como se define produtor. Se encararmos esse termo em lato sensu, de que produtor é quem faz cultura, então o programa atende bem mais aos produtores. Se no stricto sensu, pensando os produtores como os que se sustentam com a cultura, então eles ganham neste programa só quando a população necessita.

100 - É possível um “choque de democratização” estética no país, multiplicando o acesso e a produção da arte como alternativa econômica concreta para comunidades locais, ou seja, fazer a Funarte chegar à população, ao invés de manter uma postura passiva de órgão que recebe projetos?

CF - Essa é um pouco a missão da Funarte, e o que estamos fazendo. Não digo com termos bombásticos como “choque”, mas de construção da democracia, de um ambiente no qual a arte chegue à população, tanto no seu fazer como no seu fluir. E vamos trabalhar nesse sentido, construindo bases para que esta política de democratização avance de forma significativa nos próximos quatro anos.

100 - Linhas de fomento que visem à produção independente como alternativa econômica estão em pauta neste novo momento da Funarte?

CF - Estamos estudando uma forma de atuar em grande escala no fomento de pequenos projetos. Está em discussão, na Funarte e no Ministério, trabalhar com projetos que necessitem de até R$ 15 mil, principalmente em cidades de até 50 mil habitantes. Mas isso ainda está em estudo e não podemos dizer ainda que haverá algum plano. Há, porém, a intenção de ter uma destas linha ativa até o final de 2007. Há outros projetos que estamos estudando também nesse sentido de levar a cultura para a população. Um dos projetos é o de colocar o acervo da Funarte à disposição da população, até em parceria com projetos de outros Ministérios e de Secretarias Estaduais.

100 - É possível escapar das políticas setorialistas, ampliando programas e projetos como os Pontos de Cultura para serem pensados como espaços culturais de participação e construção de cultura?

CF – Sim, e a participação em espaços como estes vai ser ampliada. Temos agora o interesse da Funarte de trabalhar mais junto do Cultura Viva e dos Pontos de Cultura. Nos Pontos de Cultura, a questão inclusive é a disponibilização de pequenos projetos, direto com o produtor. Não se estará mais fomentando uma ONG, mas o próprio artista, algo próximo do VAI de São Paulo, programa de fomento que não tem um edital por área ou um corte por linguagem. O que é julgado lá é a qualidade do que o artista propõe, independente da linguagem que utiliza ou na qual se ancora.

100 - Por sua característica própria como Fundação, praticamente uma agência, é possível e almejado que a Funarte atue como um ponto de geração de sinergias entre governo, terceiro setor, iniciativa privada e movimentos? O que falta para isso, e quais os modelos de gestão cultura que podem emergir daí?

CF – Claro que é essa a preocupação do Ministério como um todo. E a Funarte está pensando e agindo neste sentido. Mas temos que ir com calma, como aquela sacada do Garrincha ao perguntar pro técnico se o adversário já tinha concordado com o esquema tático. É necessário antes acordar e sensibilizar os futuros parceiros, e a gestão Gil tem estado atenta a este sentido. Há grupo de estudo entre os Ministérios da Cultura e Educação, trabalhos com outros Ministérios, e isso está levando a resultados. Mas é uma ação a longo prazo, um processo que é demorado, e não há ilusão de que isso aconteça magicamente.

100 - Como pensar, do ponto de vista econômico, soluções para os problemas de difusão e distribuição dos produtos culturais? Quais as ferramentas que podem ser melhoradas e quais se fazem necessárias neste sentido?

CF – Está aí outra coisa que temos de começar a mudar. Temos os modelos da Rouanet e seus editais e existe uma cultura hoje no Brasil que reforça a produção, muito concentrada no eixo sul-sudeste e RJ-SP, e pensado pouco no público. Com o modelo atual, normalmente se pensa em um show que será apresentado em um dia, ou uma peça de cinco semanas. E, com isso, parece até que a atividade econômica que caracteriza a Cultura sumiu. Diferente de 10, 15 anos atrás, quando havia peças que realizavam até oito sessões semanais, hoje a grande maioria mantém-se com duas ou três apenas.

Mudar isso é uma coisa complicada, e temos poucas formas de fazê-lo, mas cada vez mais temos pensado em formas de fazer o produtor pensar em seu público. Hoje, vivemos uma lógica em que o produtor vive de e pensando em seu próximo financiamento. Temos estudado isso, na discussão das Instituições Normativas inclusive, para saber como mudar o foco da produção pura e simples para o foco no público, para crescer o consumo de peças, shows, espetáculos e etc. Temos pensado em como podemos estimular isso, mas não existe nenhuma mágica ainda não, nenhuma varinha de condão, até porque, da forma que o modelo está colocado, ele acaba resolvendo a questão do dinheiro do produtor. Muitas vezes, com uma pequena temporada paga, vale mais a pena pensar na próxima temporada do que atender a um público maior. Paradoxalmente temos mais produções, porém em um mercado que não se amplia ou talvez até se restrinja.

100 - Apesar da má recepção da mídia a projetos como a Ancinav, é possível se pensar nesta gestão em mecanismos de controle público e gestão participativa na Cultura, até como os conselhos dos CEUs e experiências como o Orçamento Participativo e o VAI funcionaram em São Paulo durante a gestão Marta Suplicy?

CF - Tenho trabalhado esse ponto aqui na Funarte. A nossa idéia é criar uma forma, um conselho público de controle, até porque não temos. A nossa proposta de mudança do Estatuto parte por aí. Na gestão, tudo tende a melhorar com o controle público. A Democracia Participativa tem demonstrado ser uma ferramenta que traz grande vitalidade às gestões. Na minha gestão na Secretaria Municipal da Cultura em São Paulo, implantei diversos mecanismos de controle público, como o Conselho Municipal de Cultura, o Parlamento Municipal de Cultura e os conselhos locais, todos muito importantes para a gestão da Arte e da Cultura.

100 – Como assim uma reforma no Estatuto?

CF – O regimento da Funarte não tem um conselho curador, que é um exemplo de ferramenta para controle púbico. O controle das ações da Fundação está restrito aos seus diretores. Esse e alguns outros pontos estão em estudo para serem alterados, no sentido de tornar a Funarte um organismo mais republicano.

100 - Quais as idéias na Funarte para o apoio às vanguardas, tanto em artes e modelos de arte consagrados como em novas tecnologias, em especial as digitais, pouco discutidas nas políticas de fomento à Cultura.

CF – Sabe, a Funarte sempre foi considerada elitista. Sempre foi considerada uma instituição que apoiou mais a vanguarda do que a cultura popular. Não foi verdade, como não é verdade que vamos deixar de apoiar as vanguardas. Hoje se tem, na arte e na música especialmente, nas artes cênicas também, apoio a grupos de ponta. Na área de novas tecnologias, realmente temos de trabalhar mais a cultura digital, o que é uma proposta do próprio Ministério. Estamos nos organizando para tanto por meio do canal virtual, que está já estruturado, com equipamentos novos. É um programa que já existia, mas que ainda não se colocou publicamente de forma mais definitiva, e que trabalha com novas tecnologias na produção e na difusão. Estamos trabalhando bastante também na perspectiva do que poderá ser feito com a TV Digital, na produção de conteúdo para ela. Mas ainda há muito com o que trabalhar.

Um outro ponto que é importante pensar é que não é mais urgente nem fazer chegar o que já existe nem criar o novo ou a partir do novo. Não são coisas excludentes, e tão importante quanto fazer cultura é receber produtos culturais.

(*) Guilherme Jeronymo é repórter do 100canais - núcleo editorial de jornalismo cultural independente.

3.6.07

Paulo Miranda expõe em Uberaba

Meus compadres e comadres.

O artista Paulo Miranda expõe em Uberaba a partir do próximo dia 05, terça-feira, conforme cartaz ao lado. A seguir, deixo na responsabilidade do grande artista Hélio Siqueira um breve comentário sobre Paulo Miranda.

DA PALPABILIDADE DO GESTO A VISIBILIDADE DA FORMA

“Mais ainda do que criar imagens a função do artista é revitalizar a própria imaginação e o imaginário coletivo”. Roberto Matta.

Numa época de perspectivas cruzadas, concordo que o artista torna-se um guerrilheiro caminhando sobre situações nebulosas. Lança-se sempre em pesquisas alternativas, nos campos minados da criação, nos vôos em queda livre para desafiar o branco, nos exercícios em corda bamba para ocupar os espaços e sem medo de errar, vai encontrando outras saídas alargando sua capacidade perceptiva, e consequentemente dando sentidos inusitados para suas criações.

Paulo Miranda é um desses artistas que vive perigosamente arquitetando possibilidades, refazendo escombros, costurando pedaços, reconstruindo superfícies, num jogo racional e emocional de desconstruir o construído para coloca-lo em forma novamente repetindo, quero dizer, recriando como Sísifo, condenado pelos Deuses, a carregar eternamente a pedra/espiral da criação.

O papel no início de sua carreira, há vinte anos atras, foi a mola propulsora para suas investigações. Paulo encontrou nesse material possibilidades infinitas, fosse colando papel sobre papel- branco sobre branco, preto sobre branco, preto sobre preto, e no esfregar, arranhar, construir e destruir de superfícies transformou os espaços em partes indivisíveis, onde o suporte vira corpo da obra e não contenta mais em só ser suporte.

A recompensa para esse trabalho de guerrilheiro incansável veio através do prêmio do 8º Salão Paulista em 1990 e dos comentários veiculados na imprensa por Radha Abramo, destacando-o como um dos artistas mais promissores da sua geração.

Numa época em que a subversão foi institucionalizada, Paulo vai a cada nova fase subvertendo a matéria mais e mais e nos “Vestígios” de sua segunda fase coloca toda sua inquietação onde forma e fundo, conteúdo e continente são equivalentes e o estilhaçamento das matérias sempre em sobreposições deixa transparecer os vãos – invólocros que guardam memórias de um tempo perdido quase em decomposição.

Visualidade na arte é construção e Paulo Miranda lança-se de corpo inteiro sobre os acasos dessa dualidade destruir/construir, sempre atento e antenado não deixa que a técnica se torne uma mera obsessão, ela é reinventada a cada dia no recomeço de cada trabalho.

Nesta forma lúdica e lúcida de trabalhar com o papel, a cola, o pigmento a pedra fragmentada e depois a tela o artista aproximou as fronteiras do desenho com a pintura, chegando mesmo a transformá-lo num só corpo indissolúvel – resistente a aceitar qualquer conformismo ou qualquer sugestão fácil. Nas saturações voluntárias a matéria áspera ou delicada, dobra-se como couro nas mãos, não mais de um desenhista mas de um escultor onde a lona desgastada pelo uso, funde-se ao trabalho embrionário que se adivinhava no início de sua carreira.

Nos trabalhos atuais o desenho não é descartado, o artista descobre outras formas de desenhar, seja através da impressão de formas familiares, tais como fachadas de oratórios ,sacrários e grades, seja saturando os esfacelamentos dinâmicos dos gestos e sobreposições que inseridas na construção do trabalho abrem ou fecham portas, sacralizando as fechadas e dessacralizando as abertas permitindo ao espectador momentos de descoberta e contemplação.

Paulatinamente Paulo, com sua linguagem pessoal, vai se impondo e abrindo caminhos encontrando uma forma poética de falar da diversidade do mundo, dando visibilidade inconfundível à sua criação e tecendo comentários sutis sobre nossa precária existência.

Hélio Siqueira
Artista Plástico

2.6.07

Serra extingue delegacias regionais de cultura

O governador de São Paulo, José Serra (PSDB), extinguiu nesta quinta-feira (31), por decreto, todas as 13 Delegacias Regionais de Cultura do estado, cuja área de abrangência alcança cerca de 400 municípios. Os delegados não foram avisados previamente da decisão - souberam da exoneração apenas ao ler o Diário Oficial do Estado.

“O interior de São Paulo representa dois terços da população. Nós merecemos consideração”, disse, emocionada, a delegada regional de Bauru, Suad Haddad Barrach, enquanto limpava as gavetas para fechar a delegacia (que abrangia 39 municípios, entre eles Botucatu e Jaú). Ela recebia R$ 1,7 mil brutos para exercer o cargo, cuja principal atribuição era favorecer a interiorização da política cultural.

De acordo com o secretário-adjunto de Cultura do Estado, Ronaldo Bianchi, o fechamento das delegacias deveu-se a dois fatores. O primeiro: atender à determinação de Serra de reduzir em 15% o número de cargos de confiança no Estado. Segundo, a busca por “atender melhor” ao interior, o que será feito agora pelas Oficinas Culturais do Estado - essas são organizações sociais geridas por instituições independentes.

Os delegados se queixam de que, desde 2006, não tiveram verba para implementar nenhuma iniciativa. Por outro lado, o Estado investiu R$ 2,5 milhões na realização da Virada Cultural no interior - segundo eles, um evento circunstancial e de efeito apenas publicitário. “Com esse dinheiro, teríamos projetos para seis meses em todo o Estado”, disse Suad.

Fonte: O Estado de S. Paulo

1.6.07

Em Nome de Deus

Meus compadres e comadres: mais essa agora!

Projeto de Lei em trâmite no Senado quer incluir recuperação de templos religiosos na Lei Rouanet. O autor, Marcelo Crivella (PRB-RJ), é sobrinho de Edir Macedo, fundador da Igreja Universal do Reino de Deus.

Carlos Minuano*

A classe artística e grande parte do setor cultural, depois da polêmica criada recentemente com a Lei de Incentivo ao Esporte, teme agora ter que dividir recursos com as igrejas. A ameaça vem de um Projeto de Lei que tramita no Senado e que propõe incluir os templos religiosos entre os beneficiários da Lei Rouanet de incentivo à cultura. Para o autor da matéria, o senador Marcelo Crivella (PRB-RJ), as religiões e seus templos devem ser reconhecidos como elementos do patrimônio cultural. Crivella é sobrinho de Edir Macedo, fundador da Igreja Universal do Reino de Deus.

A controvérsia espalhou-se rapidamente na internet por meio de diversos textos de protesto que rechaçam a idéia do senador, e ainda na forma de uma petição eletrônica endereçada ao Congresso, pleiteando que a Lei Roaunet continue a ser usada em favor da cultura brasileira e não para “trampolinagens pseudo-religiosas”, conforme argumenta o documento que já teve a adesão de milhares de pessoas. Se o projeto for aprovado, prossegue o texto, “templos de qualquer natureza ou credo religioso também poderão ser beneficiados”.

Procurado por esta reportagem, Crivella, por meio de sua assessoria, afirmou que a emenda apenas sugere uma alteração conceitual. “A religiosidade também é uma manifestação cultural, o texto propõe esse reconhecimento”, observou um assessor que não concordou em ser identificado. O senador, no entanto, parece esboçar um recuo ao pedir atenção para um detalhe do texto que, segundo ele, especificaria que os recursos apenas poderiam ser utilizados em templos do século passado, tombados como patrimônio histórico.

Para a classe artística a defesa apresentada pelo político é uma forma de camuflar a verdadeira intenção. “O que o senador Crivella quer é um absurdo, se fosse realmente para preservação de patrimônio histórico então não seria necessário, já está na lei. Claro que a intenção é de abrir uma brecha”, ressalta Jô Soares. Ele aproveita para reclamar da falta de políticas que tornam o setor cada vez mais vulnerável. “Apesar do Ministério da Cultura estar sob a direção do [Gilberto] Gil, um dos maiores artistas brasileiros, e meu amigo, a atenção dada ao teatro e à classe artística é muito pequena”.

Outra voz indignada com o projeto do senador Crivella é a do ator e autor Juca de Oliveira. Ele observa que os recursos da Lei Rouanet são atualmente insuficientes para as demandas da cultura, e adverte para a as graves mazelas do setor. “Bibliotecas estão sucateadas, obras de arte encontram-se abandonadas em porões de museus, por falta de recursos para recuperação, jovens não conseguem realizar seus sonhos, não me refiro apenas ao teatro, mas à dança, à música e a outros meios de expressão artística, ainda assim o senador quer dar uma ‘mordidinha’ na Lei Roaunet”.

O senador Crivella procura justificar sua idéia afirmando no texto do Projeto de Lei que “nada expressa melhor a formação da cultura brasileira que o caldeamento das diversas religiões, seitas, cultos e seus sincretismos, que, durante séculos, moldaram o processo civilizatório nacional”. Por meio de seus assessores, afirma ainda que os recursos seriam provenientes do mecenato, e que, portanto, não disputariam com a cultura. Para o produtor artístico Nilson Raman, o argumento só indica outro obstáculo a ser enfrentado: as distorções da Lei Roaunet. “Ela foi criada em um tripé: Fundo Nacional de Cultura [FNC], para os projetos que não tem visibilidade comercial; Mecenato para parcerias público-privadas e o Fundo de Incentivo Cultural à Arte [Ficarte], para atender grandes produções. Apesar disso, todos ficam no Mecenato, parece que só existem recursos do Mecenato”. O Projeto de Lei do senador Crivella aguarda para ser votado no plenário do Senado, se for aprovado segue para a Câmara, segundo informações da Subsecretaria de Comissões Permanentes do Senado.

(*) Carlos Minuano é repórter do 100canais - núcleo editorial de jornalismo cultural independente.