10.4.07

Paixão e ressurreição de Carta Maior

Vinha acompanhando com apreensão, mas também com a necessária compaixão (no sentido de “sofrer com”) e solidariedade, já há alguns meses, as dificuldades da Carta Maior – uma verdadeira via-crúcis, diga-se. O maior susto, porém, aquele de deixar-nos empalidecidos e emudecidos, deu-se mesmo no dia 30 de março. Ao tentar acessar a Agência, mais pra ver se tinha saído um novo editorial com alguma boa nova, simplesmente não consegui o acesso. Aparecia na tela do computador, como com bom humor registrou uma leitora, um tal de “Bad Gateway” – algo assim, um tanto sinistro, barrava-nos. Pensei com meus botões: terá sido o fim? Sei que, como eu, muitos leitores pensaram o mesmo, e também ficaram apreensivos – e temeram pelo pior.

O site da CM esteve inacessível por todo aquele longo fim de semana, até o final da tarde, já quase noite, da terça-feira seguinte – portanto, do dia 30 de março a 03 de abril. Porém, em seguida, em um novo editorial (seria o quarto) Flávio Aguiar, falando em nome dos abnegados da Redação, anunciava o que seria um primeiro passo rumo à salvação da lavoura: havia ocorrido apenas uma pane técnica, e já se anunciava, num horizonte bem próximo, um novo e providencial patrocínio. “Tu vens, tu vens... eu já escuto os seus sinais” – pensei, numa alegoria do velho testamento, remetendo ao que seria a anunciação de um porvir auspicioso, alvissareiro. Alvíssaras! Outros patrocinadores decerto apareceriam em seguida. O nosso trabalho (na verdade, quase um sacerdócio) prosseguiria, impoluto, necessário.

Acompanhei, pari passu, sentido as dores n’alma, todo o “martírio” por que passou Carta Maior, seus funcionários, leitores e colaboradores. Vi surgirem, aqui e acolá, sinais de solidariedade e companheirismo. Li, logo no início da crise, pelo menos quando ela tornou-se pública, uma nota no blog do Nassif; logo em seguida duas notas, muito boas, no blog do Zé Dirceu. Li também um texto, o primeiro de mais fôlego, do editor do site Envolverde, muito bem repercutido no site do Observatório da Imprensa, através de um artigo de Venício A.de Lima intitulado “A morte anunciada de Carta Maior”. Chegavam, aos poucos, de alguns poucos veículos e profissionais da imprensa, uma e outra porção de ungüento e alento para as nossas dores e desalento. Porém, senti a falta da manifestação de apoio de muitos de nossos colaboradores e, principalmente, o silêncio eloqüente de Mino Carta e Paulo Henrique Amorim. Aqui, na Agência, li, comovido, o correto, mas questionável em alguns de seus argumentos, texto de Bernardo Kucinski e o definitivo texto de Verena Glass (leia aqui) – esse último merece atenta leitura, pois se trata de depoimento de alguém que estava no olho da tormenta, por assim dizer.

E li, principalmente, uma a uma, todas as manifestações dos leitores – um pouco mais de trezentas – que chegavam e se somavam, numa onda de solidariedade, a cada editorial. Alguns, preocupados de fato com a situação financeira da Agência, ofereciam-se como doadores de recursos. Outros sugeriam a boa idéia de uma criação de assinaturas pagas (o que ocorreu, só para registro histórico, na fundação da Agência no 1º FSM) e até mesmo a instituição de uma Fundação Carta Maior (para efeito de renúncia fiscal, esses lances). E por aí seguia o elenco de propostas e idéias das mais sortidas e instigantes. O primordial, naquele instante, segundo depreendia-se dos vários depoimentos, era manter em funcionamento o veículo. Para muito além de todas as sugestões bem intencionadas (algumas serão, certamente, algum dia, de algum modo, aproveitadas), ficou a certeza de que não estamos sós – não somos muitos, decerto (chegaram pouco mais de trezentas mensagens em solidariedade à Agência e ainda somos pouco mais de 36.000 leitores cadastrados – só para efeito de comparação, o principal veículo da mídia conservadora e golpista, a revista Veja, tem mais de um milhão de assinantes). Porém, somos poucos e bons. Somos valentes. Temos a nos guiar e mover o ideal de transformar esse país em uma nação mais justa e solidária. Tomara meu Deus, tomara. Uma nação solidária.

Agora, chega de crise. Agora é hora de pôr, novamente, a mão na massa; transformar a essência em palavra, a palavra em gesto, o gesto em movimento, e fazer o mundo girar, virá-lo de cabeça para baixo (no bom sentido, claro), transformá-lo – como nos sugere, inclusive, o próprio logo da Agência. Agora é hora – e quem sabe faz a hora, não espera acontecer – de espalharmos por aí, de mão em mão, iluminando caminhos e incendiando corações e mentes, essa chama milagrosa da ressurreição, que arde e brilha novamente em nossos olhos e olhares vívidos de paixão – olhos e olhares prenhes de amor, perplexidade, dor e sofrimento, mas também de alegrias. Carta Maior ainda vive! Vida longa à Carta Maior!

Lula Miranda